segunda-feira, 4 de junho de 2007

Quanto a greve e contra a hipocrisia

A quem possa interessar,

Como me posicionei a favor da greve desde o início, acredito que seria um ato covarde não me manifestar, embora essa discussão também tenha me deixado bastante triste. Não que a discussão em si seja ruim, pelo contrário, acredito no processo dialético como forma de construção de pensamento, opinião e caráter. A tristeza é fruto da constatação de que pessoas que convivem há quatro anos estão utilizando um tom de certa forma agressivo para se posicionarem politicamente e um clima de inimizade está sendo criado, talvez, à toa, embora duvide que a intenção de alguém seja “agitar briga”.

A principal origem de minha tristeza, porém, é o fato de que tanto tempo tenha se passado para que nossa turma tenha uma discussão ideológica séria. Afinal, estamos na universidade e se não tivermos discussões ideológicas aqui, onde teremos? Falando estritamente por mim, julgo que apenas tal fato, a possibilidade de uma discussão ideológica, política, envolvendo a maioria dos alunos da biologia já justifica toda a mobilização que tem sido feita, independentemente das causas defendidas.

Agora, quero comentar alguns argumentos, deixando muito claro, entretanto, que embora os argumentos que quero comentar tenham sido expostos por pessoas, não é a elas que me dirijo, apenas quero exercer meu direito de emitir minha opinião acerca de qualquer comentário. Claro que em última instância estarei concordando ou discordando das pessoas que se manifestaram, mas espero já ter deixado claro que não é o objetivo. Tenho, sim, algumas coisas contra algumas pessoas, não amo a todas, o que me é muito benéfico, pois garante a saúde de meu coração que talvez não suportaria a dor de ser decepcionado por pessoas amadas. De qualquer forma, meus afetos e desafetos não têm relação nenhuma com o que escrevo, mesmo porque discordarei de pessoas das quais gosto e admiro muito.

Acredito que o primeiro ponto digno de atenção é deixar bem claro que na atual conjuntura não há apenas dois extremos no que diz respeito em relação ao posicionamento da greve, como na maioria das coisas da vida. Há pessoas que defendem a greve e um ensino público de qualidade por ideologia. Consideram uma luta em prol dessa causa acima de faltas, avaliações, pois em última instância, tais coisas assumem a forma de meras banalidades e futilidades quando comparadas a uma ideologia. Há, em outro extremo, pessoas que não aceitam a greve como forma de luta social e simplesmente não deixarão de entrar nas aulas, independente da decisão da maioria. Não vou julgar se tal comportamento é uma manifestação de egoísmo ou não, pois a minha opinião não fará a menor diferença para pessoas que pensam dessa forma. Todos temos consciência e se um parecer dessa pode nos convencer se somos ou não egoístas.

A grande questão é que entre esses dois grupos existem pessoas que não concordam com a greve, mas que estão dispostas a não entrar em sala de aula para respeitar a opinião da maioria dos alunos que votaram em assembléia, desde que não lhes haja prejuízo. Não vejo razão para que estes alunos sejam punidos e, infelizmente, foi o que aconteceu. O primeiro grupo, o dos que defendem a greve e a luta pelo ensino (o que não significa que quem seja contra a greve não defenda a luta pelo ensino público de qualidade, que fique bem claro), não se importam com o fato de perderem aula. O segundo grupo, não foi prejudicado em nada, pois recebeu o conteúdo. O terceiro grupo, porém, dos dispostos a acatar a decisão coletiva desde que não sofressem prejuízo é que foram os únicos prejudicados, pois em momento algum eles puderam optar entre assistir a aula ou não, mesmo que fossem prejudicados caso não o fizessem, o que fere a premissa da qual partiram para respeitar a opinião coletiva. Caso ninguém houvesse entrado em sala de aula, ninguém seria punido com falta e a matéria seria reposta, conforme já havia informado a professora. Já que a aula só ocorreu porque algumas pessoas entraram em sala, o mínimo que estas poderiam fazer seria avisar as demais para que elas pudessem aceitar ou não o prejuízo que sofreriam ao se ausentarem. O ocorrido foi uma sucessão de telefonemas diretamente para a professora questionando se haveria aula. Em nenhum momento alguém pegou no telefone para avisar os colegas de sala ou lhes enviou e-mail. A posição da professora foi louvável: se houver alunos, darei aula. Não deveria haver alunos, logo não deveria haver aula. Por que não deveria haver alunos? Porque estamos em greve e como ninguém se manifestou na direção de “furar a greve” até o momento da aula, esta não deveria ocorrer. Foi o que ficou previamente estabelecido e o que foi informado aos alunos. Se alguém entrou na aula por não saber que estávamos em greve, então é uma boa hora para que essas pessoas reflitam a respeito das conseqüências da alienação, que normalmente prejudicam apenas o alienado, mas dessa vez prejudicaram a muitas outras pessoas.

Concentrarei-me a partir de agora na contra-argumentação do que tenho lido e escutado. E serei extenso.

Em primeiro lugar, o argumento de que o Serra já foi da UNE, é professor da Unicamp e por isso devemos não nos manifestar contra suas decisões, pois ele pode melhor do que ninguém tomar decisões em nosso benefício, é ingênuo. No cenário político, vidas são decididas por ações que nossos governantes tomam enquanto ocupam tal posição e concentram o poder decisório em suas mãos e não por discursos passados. Obviamente há várias razões para mudanças de postura: a possibilidade das pessoas mudarem de opinião é a mais simplista. Além disso, quando o Serra era presidente da UNE, ele defendia politicamente os interesses de uma classe, a dos estudantes. Agora, ele defende e representa os interesse de outra. Nada de se reprimir, afinal esse é o jogo político: classes diferentes defendem interesses diferentes de acordo com suas aspirações e possibilidades. É por isso que encontramos tanta dificuldade em nos conciliarmos com os professores. Somos classes diferentes. Eles já possuem uma posição sólida, uma carreira feita, e muitos não estão dispostos a se indisporem com seus empregadores para erguerem uma bandeira ideológica, como a defesa da qualidade do ensino público. Talvez quando tivermos nossas carreiras consolidadas também não defendamos causa alguma, a não ser a nossa própria (espero que não).

Acredito ser desnecessário, para dar maior legitimidade a este argumento, citar um exemplo, mas o farei do mesmo jeito: nosso atual presidente já foi um grande defensor do sindicalismo e da causa operária quando se inseria nessa classe e hoje, não entrando no mérito da qualidade de seu mandato, acredito ser consoante que suas ações estão aquém do esperado em relação aos operários. E ninguém deixa de criticá-lo por não sanar os problemas das camadas sociais menos favorecidas. Reitero: um mandato é feito de ações e não discursos passados.

Em relação ao argumento de que devemos acatar suas decisões porque ele é nosso governador eleito democraticamente, não posso deixar de manifestar minha decepção. Da mesma forma que há pessoas questionando o fato das assembléias terem sido democráticas ou não, é possível questionar se nosso processo eleitoral é democrático, visto que alguns setores da sociedade simplesmente possuem mais voz do que outros. Mas não vou me alongar nessa questão. Precisamos partir do pressuposto de que vivemos em um estado de direito, democrático, caso contrário nada terá valor legal. De maneira análoga devemos aceitar que a Assembléia Geral dos Estudantes de Biologia foi, de fato, um espaço democrático, pois foi convocada e divulgada de maneira correta, conforme o estatuto que nos rege e o quorum foi bastante superior ao mínimo para lhe conferir legitimidade.

Concordo que nem todos puderam comparecer, mas infelizmente não haveria um único horário em que isso fosse viável. O curioso é que ninguém, absolutamente ninguém, se manifestou no sentido de modificar o horário porque não poderia comparecer. Considero uma colocação muito séria acusar algo de antidemocrático e, portanto, considero muito irresponsável fazê-lo da forma como se está sendo feito, afirmando que não se pôde comparecer se não houve proposta de mudança de horário. Mais: nossas decisões são regidas por nossas prioridades e a prioridade de alguns alunos foi comparecer à Assembléia, desmarcando outros compromissos. A prioridade de outros, não. De ambas as decisões decorrem conseqüências que devem ser acatadas de maneira respeitosa, afinal, ninguém foi obrigado a comparecer ou se ausentar. Quanto à analogia com as eleições para nossos representantes, não acredito que seja válida: além da questão da proporcionalidade que deve ser ponderada (uma eleição com 100 milhões de votantes é gritantemente diferente de uma com 212) há a questão fundamental de que as eleições nacionais, estaduais, municipais, são obrigatórias. Logo, é preciso oferecer um tempo maior para que as pessoas exerçam seu dever. No nosso caso não se trata estritamente de um dever e sim de um direito e, portanto, não há necessidade de ser oferecido tanto tempo. Há ainda uma questão prática: seria muito mais fácil manipular o resultado caso a votação fosse feita através de urna, além do empecilho adicional de que as pessoas votariam alienadas, embora as pessoas tenham todo o direito de votarem alienadas e é isto o que ocorre comumente. Verdade é que não há um manual prático de democracia, ela é construída por pessoas e foram pessoas que, atuando democraticamente, estabeleceram um estatuto para o CAB, bem como leis que regem o processo eleitoral brasileiro. Cabe a cada um lutar para que mudanças sejam feitas ao discordam de algum ponto, mas daí a não acatar decisões coletivas com base na não legitimidade é um salto incorreto e perigoso demais.

A decepção que mencionei acima decorre do fato de existirem pessoas com uma idéia tão distorcida de democracia e cidadania que realmente acreditam que o momento do voto é o único onde podemos exercer cidadania. Se assim fosse, não viveríamos em democracia. Exercer cidadania vai muito além de depositar um papel em uma urna ou teclar um painel eletrônico e aguardar retratos pouco fotogênicos de pessoas desacreditadas. Exercer a cidadania é se mobilizar quando uma decisão tomada por um governante é vista como prejudicial. É cobrar, questionar, exigir. No período eleitoral, os candidatos não informam todas as atitudes que tomarão. Caso Serra tivesse feito isso, por exemplo, informado suas pretensões em relação ao funcionalismo público ou ensino superior, duvido que teria recebido tantos votos quanto os que recebeu. Se não estou ciente de todas as decisões a serem tomadas por meu candidato no momento em que voto, por que diabos teria que concordar com todas posteriormente?

Uma forma de contestação historicamente consagrada é a desobediência civil. Cito, apenas com caráter panfletário, o fato de um país ter conquistado a independência lutando apenas através de desobediência civil. Outros países, porém, o fizeram através da violência e da revolução armada. Embora meus conhecimentos históricos sejam bastante limitados, acredito que há basicamente essas duas formas de luta social: através da violência; e através do pacifismo, da desobediência civil. Eu sou contra a violência por princípios, logo, não poderia assumir uma postura violenta para lutar socialmente por aquilo em que acredito. Alguém, por favor, demonstre-me uma outra forma eficiente de luta pacífica que não seja através da desobediência civil (que inclui greve e/ou manifestação pública) e eu voto contra a greve assim que puder. Será que ninguém percebe que a greve é utilizada como um último recurso? Para forçar uma negociação que de outra forma não ocorreria entre certos setores da sociedade e seus representantes? Será que ninguém percebe que mesmo aqueles que votam a favor da greve sofrem prejuízos enormes, maiores até do que aqueles que votam contra? Quem vota a favor e depois atua no sentido de manter a mobilização das pessoas sofre os maiores prejuízos, pois basicamente todas as horas do dia são consumidas nesse trabalho (faz seis horas que estou escrevendo este e-mail, por exemplo).

E por favor, como é possível afirmar que a greve não atinge os governantes? Em todas as agências de notícia virtuais, jornais, revistas, estão discutindo a questão dos decretos e das manifestações contra esses. Querendo ou não, expressões como “autoritário” e “ataque à autonomia” estão sendo associadas ao nome José Serra. Pode ser que a notícia seja para afirmar que não foi uma atitude autoritária e que não há ataque à autonomia, mas ainda sim há associação (só especifico esse ponto para demonstrar que meu argumento é verdadeiro independentemente da linha assumida, pois apenas afirmo que há associação entre as palavras). O simples fato de essas palavras estarem próximas, embora o veículo de comunicação defenda a ação de Serra, demonstra que há pessoas que pensam de maneira contrária, ou seja: se alguém precisa vir a público defender Serra, é porque alguém o está acusando de autoritário e de prejudicar o ensino. Somando isso ao fato de ele ter que dar explicações reiteradamente, pessoalmente ou através de seus secretários e assessores, seria muita ingenuidade acreditar que não há um desgaste político, ainda mais se considerarmos que Serra é uma das possibilidades de candidatura do PSDB à Presidência da República nas próximas eleições. Além disso, não são apenas os estudantes que estão insatisfeitos com os decretos de Serra. Setores do funcionalismo público também estão. Além de haver dissidência no interior do próprio partido. Acreditar que uma greve nas universidades somada a todos esses fatores não gera desgaste político é simplesmente se recusar a acreditar no óbvio. Não houvesse desgaste, Serra não teria assumido uma postura de rever seus decretos, o que fez unicamente por pressão popular (e que não digam que foi por causa dos reitores, pois estes, em documento oficial, afirmam que a autonomia não estaria ameaçada com os decretos iniciais).

Claro que o desgaste político de Serra não é o objetivo do movimento, apenas estou afirmando que há um desgaste provocado pela greve e tal desgaste força Serra a um diálogo, que antes da greve não ocorreu, pois ninguém faz concessões caso não haja contestação, isso é trivial. Além disso, a greve não força apenas Serra a se posicionar. Já está sendo encaminhada uma ação de Inconstitucionalidade ao Supremo Tribunal Federal. Algum juiz irá determinar se os decretos são inconstitucionais ou não. Agora, por favor, respondam com sinceridade: as chances de um juiz deliberar quanto aos decretos em favor da inconstitucionalidade aumenta ou diminui se há greve e mobilização popular, de estudantes? Embora eu deseje que cada um responda essa questão a si mesmo, respondo também. É claro que as chances aumentam! Que juiz estará disposto a se indispor politicamente com o governador (talvez futuro presidente) e com o partido mais poderoso do estado de São Paulo (que já está no poder há tantos anos) se não houver pressão popular? E a forma mais contundente de se exercer pressão, independente de sua eficácia ou não (no sentido de que sejam atendidas as exigências, pensando-se estritamente na pressão popular), é a greve.

O argumento de que podemos fazer manifestações sem que para isso precisemos estar em greve é uma grande falácia, na minha opinião. Não chega a ser mentira, porque de fato podemos, não há nenhum impedimento físico à manifestação que só a greve possa romper. A questão é pragmática: como coordenar um movimento eficiente, com grande participação dos alunos, incluindo aí estudantes de todos os anos, do diurno e noturno, se todos estão se dedicando às atividades letivas normais? É simplesmente impossível. Se não houver greve não há mobilização em massa. Daí a falácia. Algumas pessoas citaram a possibilidade de se organizar manifestações sem que para isso fosse necessária a paralisação das atividades letivas. Propuseram-se, inclusive, a participar e até organizar essas manifestações, pois acreditam que algo precise ser feito contra os decretos de Serra, só discordam que o melhor caminho para isso seja a greve. Demonstrou-se, na minha opinião, uma grande hipocrisia entremeando esse discurso. Ficou claro, novamente em minha opinião, se tratar de um argumento com o único intuito de acabar com a greve. Por uma razão muito simples: essas pessoas afirmaram que mesmo com todas as suas atividades letivas seriam capazes de se mobilizarem, mas foi decretada a greve e eles não fizeram absolutamente nada (salvo meritórias exceções, pessoas que embora discordem da greve passaram a integrar os quadros das comissões organizadoras), exceto preparar cartazes contra a greve.

Que diabos de lógica hipócrita e mentirosa é essa? Afirmam que é possível mobilização sem greve, comprometem-se com isso mesmo tendo que conciliar as aulas, provas, seminários com protestos e manifestações. Porém, mesmo na ausência de todas essas atividades letivas tais pessoas não se mobilizam. Que crédito esses indivíduos esperam receber? Não se mobilizam mesmo não tendo atividades letivas, com o dia todo para se dedicarem a manifestações, mas querem que acreditemos que serão capazes de se mobilizarem terminando a greve, que serão capazes de conciliar tudo? Repito: parece-me uma tentativa de acabar com a greve, pura e simples, sem propostas sérias, uma atitude covarde, vazia ideologicamente e acima de tudo hipócrita. Por que vazia ideologicamente? Algumas pessoas talvez se façam essa pergunta. Eu respondo. Porque nós, que votamos a favor da greve acreditamos que isso aumenta a pressão sobre o governo e ainda nos oferece tempo para que possamos potencializar nossa luta. Através da greve podemos nos informar mais, protestar mais, mobilizarmo-nos mais. Acreditamos de fato nisso. As pessoas que afirmam que tudo isso é possível sem a greve, mas não se movimentam nesse sentido estão demonstrando, na minha opinião, um vazio ideológico porque não acreditam nisso, sendo o intuito simplesmente acabar com a greve. Que eu esteja errado e se a greve acabar, que as mobilizações continuem. Mas sugiro que, para ganhar algum crédito e não ficarem apenas com críticas retóricas em relação ao poder da greve, que estas pessoas proponham um dia, um horário e uma forma de manifestação que possa ser realizada por todos os alunos da biologia, da mesma forma que a greve possibilita (e eu disse que possibilita e não que tenha ocorrido). Caso contrário, não irá se tratar de uma proposta, pois “não façamos greve, apenas nos mobilizemos” não é proposta, é apenas uma tentativa de pôr fim à mobilização que já está ocorrendo.

Quanto ao argumento de que se continuarmos em greve iremos perder o foco, é simplesmente ridículo. Não há uma instância maior encarregada de determinar as pautas de uma greve, são os grevistas que o fazem. E se a greve é dos estudantes de biologia, nós, somos os grevistas! Nós determinamos nossas exigências. Perderemos o foco se quisermos, caso contrário podemos nos manter organizados.

O argumento mais covarde de todos contra a greve é de que as comissões não fizeram nada, que houve desorganização. Essa ofensa eu tomo, até certo ponto e com as devidas ponderações, de maneira pessoal, pois integro a comissão de comunicação. Nós, que nos dedicamos à organização das manifestações nos últimos dias, dentre outras coisas: criamos um blog aberto a qualquer tipo de comentário em relação à polêmica da greve; concedemos uma entrevista à Folha de São Paulo; conversamos com grande parte dos professores do IB, participamos de reuniões da farmácia, geologia, medicina, fonoaudiologia, dentre outros cursos, para colocar o posicionamento dos estudantes de biologia e expor os decretos, já que em nosso instituto eles foram amplamente debatidos; organizamos a participação em uma aula pública; alguns representantes foram à manifestação em São Paulo; confeccionamos cartazes, panfletos, comunicados, cartas; foram promovidos estudos em relação aos decretos; foram convidadas algumas pessoas para esclarecer dúvidas legais, como advogado, professor de EL, mestrando de ciências sociais, além de um contato com professores do IB para estudar a possibilidade de esclarecimento das dúvidas jurídicas; foi organizado um café da manhã com o intuito de atrair pessoas, informá-las a respeito da greve; foram organizadas assembléias e reuniões; foram estabelecidos diálogos com a vice-diretora e o diretor do instituto. Curioso que pessoas que afirmam que as manifestações não foram eficientes sejam, grosso modo, aquelas que não contribuíram com nada em termos de mobilização. Acredito que essas críticas partiram do fato de em raras ocasiões as comissões terem se reunido no IB. Mas se mobilização, manifestação, protesto, se resumisse a ficar reunido no IB, poderíamos conseguir uns sessenta cones, espalhá-los pelo instituto e pendurar um crachá em cada um com a inscrição “estudantes da biologia em greve”. O que quero dizer com isso é que são organizadas comissões exatamente para que não precise haver reuniões de todas as pessoas favoráveis à greve o tempo todo, o que seria inviável. Mas afirmar, baseado nisso, que não há organização, ou é um argumento fundamentado em ignorância (do que se está sendo feito) ou má-fé (sabe-se o que é feito, mas se procura desacreditar o movimento com mentiras).

O argumento de que “greve onde os laboratórios não param não é greve”, pode até soar verdadeiro para alguns, mas a proposta de interrupção da pesquisa foi votada em assembléia e o consenso foi de não estender a greve aos laboratórios. O grande problema é: como impedir as pessoas de entrarem no laboratório, se grande parte dos alunos têm a chave dos laboratórios, sem lançar mão de violência ou impedimento físico? Além disso, não houve envolvimento maciço dos alunos de pós-graduação nas discussões e são eles os mais atuantes nos laboratórios. Foram levantadas questões em relação ao fato de não se poder negociar com FAPESP, CAPES, CNPq os prazos para entrega de relatórios e pareceres da mesma forma que se pode negociar com professores a reposição de aulas, o abono de faltas etc. Ou seja, como parar a rotina do laboratório traria um prejuízo irreparável a todos e a intenção da greve não é prejudicar ninguém de maneira irreparável, mas sim exigir que sejam atendidas reivindicações que trarão benefícios, então ficou decidido que a greve se restringiria às aulas, além dos motivos de ordem prática, já expostos. Ainda que discordem disso, foi decidido em assembléia. Outra coisa ficou decidida em assembléia: os decretos são prejudiciais à universidade; sua revogação é desejável. Se a greve é em prol da revogação dos decretos, então ela tem uma motivação que trará benefício a todos nós, os quais nos inserimos na Universidade. Uma greve que se restringe às aulas permite que os prejuízos sejam negociados e até agora nenhum professor assumiu uma postura intransigente de prejudicar os alunos e não estar disposto a negociação, aliás, esta foi a determinação do diretor do instituto: que se negocie diretamente com os professores.

Em relação ao argumento de que a luta é fundamentada em uma revolta em ralação a prestação de contas por parte das universidades, que é simplesmente ridículo, não há muito o que dizer além do seguinte: as universidades já prestam conta de seus gastos, logo, esse não é o problema. Concordo com uma prestação de contas diárias para o estado. A universidade deve sim prestar conta de seus gastos da maneira mais objetiva possível. Em verdade, essa prestação de contas diárias, de certa forma, já ocorre na USP. Há um sistema, chamado Mercúrio, se não me engano, onde os gastos internos da Universidade são inseridos em tempo real. Acredito que na Unicamp deva existir algo parecido. A única diferença seria o destino dessas informações, que não se restringiriam mais a um controle interno da Universidade. Basta mudar o destino dos dados.

E gostaria que uma coisa ficasse clara em relação ao argumento de que o Estado (com E maiúsculo) deve determinar as políticas das Universidades públicas. Claro que deve, já que o Estado representa a sociedade e a universidade, com o perdão da redundância, é pública. Isso já ocorre desde que foram fundadas as Universidades públicas. O problema é que com os decretos de Serra, as Universidades deixam exatamente de representar os interesses públicos e ficam sujeitas à lógica partidária que se modifica a quatro anos. Os funcionários públicos não podem ser demitidos porque eles atuem em certos setores da sociedade que o Estado entende serem importantes demais para fiquem sujeitas à lógica de mercado ou dos partidos. O funcionário público tem um vínculo com o Estado e não com o mandato vigente. O mesmo é válido para a Universidade, a qual é pública pois sua atuação se dá na área de ensino, pesquisa e extensão, de interesse nacional e por isso devem ser autônomas: representam interesses sociais (vale lembrar que o ensino é defendido em Constituição para qualquer cidadão) e não dos governantes do momento, possuem vínculo com um Estado-Nação e não com um governante ou um partido.

E aproveitando a deixa, obviamente o que estamos fazendo é eminentemente político: estamos defendendo o interesse de setores da sociedade. Contudo, não se trata de um ato partidário e isto enterra mais um argumento em potencial. Recuso-me a acreditar que alguém seria capaz de afirmar que houve influência partidária na mobilização que se apresenta no IB.

Não houvesse tanta gente desrespeitando uma decisão tomada pela maioria das pessoas que se dispuseram a votar a questão, dando-lhe a prioridade que consideraram justa, poder-se-ia ter feito mais, muito mais, no que diz respeito aos manifestos. O tempo gasto para conversar com a turma em cada sala de aula impede que outras tarefas sejam realizadas. Houvesse mais pessoas dispostas a se manifestarem, como afirmaram que deveria ser feito, sem que para isso houvesse paralisação, e mais coisa teria sido realizada.

O maior desgaste recaiu sobre nós, que ficamos de porta em porta, dispostos a sermos odiados por pessoas que gostamos e respeitamos em prol de uma causa. Sobre nós, que escrevemos e-mails românticos defendendo algo que há muito tempo está sendo corroído: a educação. Faço isso (e acredito falar em nome de muitos com o que afirmarei) por acreditar que a educação, o ensino de qualidade é uma obrigação urgente que o Brasil tem para com os brasileiros. Dela decorrem muitos benefícios sociais. Custa caro para a sociedade brasileira investir em educação pública de qualidade? E quanto custa não fazê-lo? Considerem o custo como quiserem, moral ou econômico, pois de qualquer forma é muito mais caro, dispendioso dar às costas a educação.

Polêmica à parte, todos estão defendendo posições ideológicas. O mínimo que se pode exigir para uma ideologia é respeito. Não faço diferente.

Abraço a todos.

Victor (Trolha) 04D.

Um comentário:

Camila Carlos disse...

Mais aliviado?
Pq eu me sinto. hehehe
beijos